quinta-feira, 30 de junho de 2011

Transformers: O Lado Oculto da Lua


O mais incrível desse filme é que fiquei 2 horas e meia olhando pra tela e acho que nenhum minuto isolado fez algum sentido!

Pra mim, qualquer bom filme funciona mais ou menos como uma equação matemática: os símbolos vão sendo apresentados pra gente um de cada vez, nós vamos interpretando o significado de cada um deles, associando-os aos outros que vimos anteriormente, armazenando tudo numa estrutura cada vez maior, até que no final chegamos a um significado - um significado que depende da relação de todos esses elementos, e que perderia o sentido caso um "x" fosse substituído por um "y".

Transformers 3 é como uma equação - uma equação feita por uma pessoa demente, que em nenhum momento entendeu que esses símbolos significam alguma coisa, e achou que bastaria fazer uma colagem de letrinhas e sinaizinhos, organizados num formato que imitasse vagamente o de outras equações que ela viu antes.

A única maneira de aproveitar a loucura que é esse filme é sendo igualmente insano - reagindo apenas ao imediato, ao que se vê na tela naquele instante, sem fazer qualquer tipo de associação com o que veio antes, sem nenhuma expectativa em relação ao que virá depois - apenas se divertindo com uma frase engraçadinha, com um carro bonito, com uma garota de lábios sensuais, até que os estímulos acabem e as luzes do cinema se acendam.

Sem exagero, em termos de super-produções é uma das piores coisas que eu já vi! Chega a ser inacreditável. E pior do que o filme em si é encontrar o nome de Steven Spielberg nos créditos finais como produtor executivo. Se eu saí da sala tendo calafrios de vergonha alheia só de ter assistido ao filme, fico imaginando ele que teve que assinar embaixo!

Transformers: Dark of the Moon (EUA / 2011 / 157 min / Michael Bay)

INDICAÇÃO: Quem gostou de Transformers 2, O Incrível Hulk, O Escorpião Rei, etc.

NOTA: 2.5

terça-feira, 28 de junho de 2011

Carros 2


Mais um caso óbvio de Herói Envergonhado. Como se não bastasse o protagonista Lightning McQueen já ser um herói envergonhado, o filme resolve descer ainda mais baixo e focar no coadjuvante Mater - o caminhãozinho enferrujado - este sim um típico "pobre-coitado", e fazer dele o herói do filme.

A história foca na amizade entre McQueen e Mater, e ensina que é importante ser "leal" aos seus amigos, por um senso de obrigação, mesmo quando eles não têm nada a ver com você e estão ameaçando a sua carreira e a sua vida (McQueen em determinado momento insiste em usar o combustível do amigo, por lealdade, mesmo com fortes evidências de que o produto poderia levar o carro à explosão!).


Não achei ruim, achei apenas chato, como o primeiro. O filme foi bem de bilheteria mas felizmente a crítica não foi muito positiva e a nota do público no IMDb está bem sensata.

Cars 2 (EUA / 2011 / 112 min / John Lasseter, Brad Lewis)

INDICAÇÃO: Quem gostou de Kung Fu Panda 2, Como Treinar o Seu Dragão, etc.

NOTA: 4.0

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Um Lugar Qualquer


Escrito e dirigido por Sofia Coppola (As Virgens Suicidas, Encontros e Desencontros, Maria Antonieta), o filme mostra o dia a dia de um homem infeliz, drogado, completamente apático e desinteressado pela vida (Stephen Dorff), que ficamos sabendo ser um astro de filmes de ação de Hollywood. Ele tem uma filha pré-adolescente (Elle Fanning, irmã da Dakota), e o filme basicamente fica intercalando momentos vazios da vida dele (fazendo sexo sem significado, trabalhando na promoção de seu último filme, etc) com alguns momentos um pouco mais agradáveis junto com a filha, jogando vídeo game e fazendo coisas sem importância.

A vida dele não tem propósito (ele mesmo reconhece isso) mas o problema é que o próprio filme não tem propósito, e parece ter sido feito por um cineasta igualmente apático e desmotivado.

Não há conteúdo, psicologia, apenas um certo bom gosto técnico, uma leve tentativa de originalidade (o filme tem algumas imagens interessantes e fora do comum, embora fora de contexto) e um leve tom de cinismo ou "crítica", tentando se passar por inteligência - como um zoom longo e silencioso no rosto de Stephen Dorff tirando um molde da cabeça pra fazer uma maquiagem especial para um filme:

Uma crítica ao látex, imagino.

É um caso não muito extremo de Subjetivismo. O filme levou o Leão de Ouro em Veneza, mas ninguém levou isso muito a sério, afinal o presidente do júri era Quentin Tarantino, ex-namorado de Sofia.

Somewhere (EUA / 2010 / 97 min / Sofia Coppola)

INDICAÇÃO: Quem gostou de Flores Partidas, Encontros e Desencontros, etc.

NOTA: 4.0

terça-feira, 21 de junho de 2011

Experimentalismo e Subjetivismo

(Capítulo 17 do livro Idealismo: Os Princípios Esquecidos do Cinema Americano)

Objetividade é um dos valores mais fundamentais que buscamos na arte, e é o que permite a expressão de todos os outros valores associados ao Idealismo. Desta forma, o Experimentalismo rompe com o Idealismo de uma maneira ainda mais radical que o Naturalismo, rejeitando-o em sua base — no pilar da Objetividade — e em uma tacada só, impedindo qualquer outro valor de existir plenamente.

Experimentalismo em sua forma mais radical é representado no cinema por “filmes de arte”, aqueles que as pessoas saem da sala cada uma com uma versão completamente diferente do que foi que aconteceu, sem poder provar qual foi o propósito do filme ou mesmo se houve algum. São filmes que se rebelam contra todas as convenções, negam que uma comunicação objetiva entre artista e espectador seja uma virtude, negam que um filme deva passar uma mensagem específica, e defendem uma visão mais arbitrária da arte — como um cozinheiro rebelde que se recusa a adaptar suas criações à “ditadura” do paladar humano, querendo ser livre pra usar coisas não comestíveis como ingrediente — se ele assim desejar.

Em geral, estes são filmes sem tramas coerentes, onde os personagens centrais não têm objetivos claros, personalidades verossímeis, a história começa já no meio e o espectador tem que correr atrás do “bonde”, ficar atento às entrelinhas para entender o que está acontecendo. São comuns cenas longas onde nada de relevante acontece, os enquadramentos são esquisitos, muitas vezes ações importantes acontecem fora de quadro como se a câmera tivesse algum tipo de catatonia ou desinteresse crônico. A trilha sonora é dissonante, não há senso de ritmo, estrutura, os diálogos são incompletos, misteriosos, raramente há um clímax, e o filme termina quase sempre em um momento inesperado, sem um grande senso de conclusão, deixando a plateia intrigada, tentando entender a mente “profunda” do artista por trás daquilo.

São filmes que veem um grande valor na estranheza, em quebrar as regras, não para mostrar algo superior necessariamente, para contar uma história de forma mais eficiente, mas pelo simples prazer de não se conformar, de questionar o sistema, de ser anticonvencional. É a rebeldia pela rebeldia em si. Não são filmes de “vanguarda”, como às vezes tentam se classificar, pois eles não estão de fato tentando levar a arte adiante, criar técnicas novas e melhores do que as já conhecidas —, mas apenas quebrar com as regras, ir contra as técnicas já provadas, passar um senso de não conformismo. Embora seja visto como inovador, o Experimentalismo de hoje muitas vezes tem a mesma cara do Experimentalismo de 30, 40, 50 anos atrás. E não é um estilo de arte totalmente sem regras. Ao contrário, ele segue uma série de convenções de gênero e técnicas bem estabelecidas para causar certas impressões no espectador. Só que essas impressões são justamente o senso de confusão, estranheza, o convite a interpretações etc. Não é algo necessariamente inventivo, original, feito para transformar a arte do futuro. Trata-se, sim, de um movimento que sempre irá existir paralelamente à arte “funcional”, questionando e desconstruindo tudo o que ela faz. 

O foco desses filmes em geral é a figura do autor e a expressão de suas preferências subjetivas, de sua personalidade excêntrica — o estilo e a identidade pessoal do autor costumam ser mais importantes do que o conteúdo e a qualidade do filme em si. Dificilmente as pessoas vão assistir filmes desse tipo pelo tema, pela história — elas vão ver “o novo do Godard”.

Nos casos extremos de Experimentalismo, não há nem como saber se o que foi apresentado no trabalho foi cuidadosamente planejado ou se foi fruto de decisões aleatórias ou de amadorismo. Nas artes plásticas, o Experimentalismo é bem mais comum do que no cinema, chegando a ser o mainstream hoje em dia (afinal, um filme custa caro, tem a necessidade de gerar lucro, o que acaba servindo de filtro contra esses experimentos).

Muita gente acaba sendo respeitosa em relação a esse tipo de arte por puro complexo de inferioridade — por medo de não ter sido capaz de entender a mensagem do artista, de ser considerada burra — o resultado pode ser visto nessas notícias, que saem cada vez com mais frequência, sobre galerias de arte onde um pedaço de lixo foi confundido com uma obra de arte pelos visitantes, que ficaram ali parados, analisando-o por horas, ou uma obra de arte que foi varrida sem querer pela faxineira, que a confundiu com um pedaço de lixo.

(Uma nota: é importante saber diferenciar o Experimentalismo real, motivado por niilismo, de filmes que são apenas menos literais, menos óbvios, que não são facilmente entendidos de primeira, mas que tenham sim um sentido racional — e esse sentido possa ser encontrado na própria obra).

Experimentalismo puro nunca é muito popular (o grande público sempre prefere histórias e mensagens sólidas — são em geral os críticos e intelectuais que se interessam por esse tipo de arte), mas muitas vezes podemos encontrar Experimentalismo em filmes mais acessíveis, populares, quando ele aparece em doses menores e ainda sobra objetividade o bastante para prender a atenção do público (vou discutir isso melhor no capítulo “Pseudo-Sofisticação”).

Experimentalismo é um tipo de Subjetivismo. Mas existem outros tipos de Subjetivismo na arte que não se encaixam necessariamente na categoria de Experimentalismo. No caso do Experimentalismo, há um compromisso com a ausência de sentido, uma intenção consciente de romper com a objetividade, de deixar o espectador desorientado, de desconstruir o conceito de arte.

Mas há um outro tipo de artista, que às vezes pode se parecer com o Experimental, mas que na verdade está tentando sim transmitir um conteúdo, integrar a obra ao redor de um tema coerente. É o artista cujo foco principal é seu universo interno, sua própria psicologia, que enxerga a arte apenas como um meio de exteriorizar suas emoções, sensações, ideias, mas que não tem uma preocupação em entreter o espectador ou em comunicar essas ideias com clareza. Pelo contrário, este tipo de artista tende a valorizar a ambiguidade, o mistério, como se o incompreensível e o obscuro fossem de certa forma mais interessantes e sofisticados do que aquilo que pode ser compreendido claramente. Então, o artista se esconde por trás de uma linguagem turva, imprecisa, deixando a obra aberta a interpretações, estimulando o debate após a sessão, querendo que o espectador se coloque mais na posição de um psicólogo tentando decifrar a mente intrigante de seu paciente.

Se o Idealismo se baseia na Primazia do Espectador, o Subjetivismo já pensa que o autor é a figura mais importante na experiência artística, e que o prazer do espectador deve ser sacrificado em nome disso. Se um filme é autoral, porém se preocupa também em entreter a plateia, ele pode muito bem ser considerado Idealista. Para cair nessa categoria de Subjetivismo, o espectador precisa necessariamente ser sacrificado, colocado em segundo plano. O filme precisa ser chato.

Uma memória pessoal que ilustra bem isso vem dos tempos em que eu trabalhava em videolocadora. Era uma rede de locadoras conhecida em São Paulo por ter um acervo grande de filmes europeus, nacionais, clássicos, além dos lançamentos comerciais. Um dos diferenciais da rede era que tínhamos uma prateleira de “Filmes de Arte” com uma seleção de filmes de diretores renomados, onde em vez de os filmes serem organizados por ordem alfabética, eles eram organizados por nome de diretor. Então tínhamos plaquinhas indicando os filmes do Antonioni, Bergman, Fellini, Pasolini, Tarkovsky etc. De tempos em tempos, sempre surgia alguém que parava ali e questionava a presença de Hitchcock na prateleira. De alguma forma, parecia estranho ver Hitchcock e Godard quase que lado a lado, colocados num mesmo saco. E de fato havia algo de estranho: Hitchcock não era chato. A vasta maioria dos diretores naquela prateleira eram chatos, o que revela algo curioso sobre como as pessoas enxergam arte. Se o critério para ser incluído na prateleira “Filmes de Arte” fosse o cineasta ser talentoso e autoral apenas (ou seja, um diretor com liberdade criativa, uma visão autêntica, individual), Hitchcock poderia estar ali tranquilamente, assim como diversos outros diretores: Spielberg, Scorsese, Mel Brooks etc. Mas não era esse o verdadeiro critério por trás da prateleira de Arte. O critério era: filmes autorais e chatos. Além de autoral, o filme tinha que ser especialmente difícil de consumir, desagradável, lento, incompreensível, falar de problemas existenciais, ter uma visão malevolente de mundo. Subconscientemente (e infelizmente), essa é a noção que a maioria das pessoas têm do que é arte.

sábado, 18 de junho de 2011

Meia Noite em Paris


O filme mais imaginativo e original que eu vejo em um bom tempo - provavelmente o melhor filme de Woody Allen desde a "era dourada" de sua carreira. O filme é um ataque divertido à nostalgia - aquela sensação que temos de que o presente é sempre desimportante, banal, enquanto as eras passadas eram necessariamente mais ricas e interessantes. O filme não tenta descobrir os MOTIVOS disso acontecer - ele simplesmente expõe essa ideia e a concretiza numa trama (que eu prefiro não comentar, pra não estragar as surpresas) misturando comédia, fantasia, filosofia e história. Woody parte de um argumento simples, interessante, e o desenvolve com total clareza, objetividade e criatividade, num filme onde nenhum minuto sequer parece acidental ou dispensável, como toda obra de arte deve ser.

O filme se passa todo em Paris (que eu nunca vi tão bonita e tão bem explorada no cinema) e não tem Woody Allen no elenco - quem interpreta "Woody" é Owen Wilson, que se mostra um excelente substituto, por incrível que pareça. Rachel McAdams também está ótima, assim como Marion Cotillar, Michael Sheen e todas as participações especiais (Kathy Bates, Adrien Brody, etc).

Mas por que o passado parece mais glamouroso do que o presente? A postagem vai ficar gigante, mas eu queria entrar mais nessa discussão que o filme levanta.

Em primeiro lugar, acho que nostalgia não se aplica a todas as atividades. Se falarmos em medicina ou informática (talvez até esporte), ninguém vai achar que houve uma era dourada há 100 anos atrás! Mas no que diz respeito à arte, certamente este é o caso.

Um dos motivos é que o passado é condensado, resumido na nossa mente, enquanto o presente não. Quando olhamos pro presente, pensamos por exemplo nos filmes que estão em cartaz essa semana - quando pensamos no passado, pensamos em eras. Ninguém pensa em "filmes que estrearam em 18 de Junho de 1941" - nós pensamos em anos, em décadas, ou até em séculos, dependendo da arte, e é claro que nenhum instante do presente pode competir com isso (daqui a 50 anos, nós vamos lembrar que vivemos nos tempos gloriosos de Steven Spielberg, Martin Scorsese, Michael Jackson, Madonna - e vamos esquecer das Ke$has e dos Robert Rodriguez).

Outro motivo é que as pessoas valorizam muito a própria infância (as memórias são mais fortes, não só por características naturais da infância, mas também por esse processo de "condensação"). Então o que acontece? Nossos pais nos convencem de que a época da juventude deles era mais importante que a nossa, e nós tentamos convencer nossos filhos de que a nossa juventude era mais importante, criando uma eterna sensação de que o passado era maior (uma coisa que Woody poderia ter feito pra zombar disso seria ir até o futuro e mostrar a Britney Spears como um símbolo do requinte do passado!). Filhos que respeitam e admiram os pais costumam também ter uma relação melhor com o passado.

Mas claro, nada vai tornar uma composição medíocre superior à uma obra-prima, só porque a medíocre foi composta 100 anos antes. O filme não se posiciona claramente quanto a objetividade ou a subjetividade da arte. É meio contraditório. Por um lado, a trama parece sugerir que é tudo relativo - o que é antigo é bom, o que é novo é ruim, e não se pode julgar uma obra de arte racionalmente. Por outro lado, o filme mostra que no passado os artistas eram muito mais inteligentes, cultos e habilidosos - sugerindo que a nostalgia no fundo é justificável, afinal no passado eles REALMENTE eram melhores!

No cinema americano e na música há de fato uma decadência. Mas não acho que isso seja um problema fixo, eterno, uma tendência da humanidade. Pra mim a culpa é da cultura e da tecnologia. Os filmes dos anos 40 não são piores que o dos anos 30. E o dos anos 50 não são piores que o dos anos 40. A coisa começou a descambar no fim dos anos 60, e isso por esses 2 motivos - porque a cultura mudou (pra pior na minha opinião) e porque a tecnologia foi tornando a produção cada vez mais fácil (no caso de cinema por exemplo). Hoje em dia, qualquer um pode fazer um filme - nos anos 50 era tão difícil que apenas alguém competente chegaria lá.

A tecnologia apenas facilita a execução e a divulgação da arte - mas não ajuda em nada na criação. O que você tem hoje é um monte de gente que PODE gravar um filme a qualquer momento, que PODE gravar uma música e jogar no YouTube - mas que não teve necessariamente que passar pelo esforço de aprender o que é isso.

Será que Leonardo Da Vinci teria feito tanta coisa se ele estivesse vivendo hoje, com entretenimento disponível no celular a qualquer instante? Será que teria se esforçado pra inventar tanta coisa, se todas as respostas já estivessem disponíveis no Google? Me parece que certa dificuldade é um fator essencial do desenvolvimento. Será que quanto mais fácil a vida se torna, menos as pessoas precisam pensar? E será que o nível de exigência das pessoas também cai, na medida em que elas se tornam menos capazes de criar?

Fico imaginando um futuro onde algumas pessoas jamais terão sofrido e também não correrão nenhum tipo de risco - elas serão fisicamente perfeitas, saudáveis, e não terão que trabalhar para os seus sustentos, pra preservar suas vidas - e por consequência, não se interessarão em compreender a realidade de nenhuma forma, pois não será necessário.

Arte, nesse mundo, serão cadeiras de massagem automáticas, projetadas por pessoas que também nunca tiveram que entender nada, equipadas com luzes coloridas e agradáveis que serão projetadas em suas retinas, enquanto elas ouvem sons harmônicos e indefinidos, sem qualquer tipo de melodia ou estrutura.

Nesse contexto, não é tão difícil de imaginar a Britney como um símbolo do requinte do passado!

Enfim, isso tudo é só uma pontinha das coisas que passam pela nossa cabeça vendo Meia Noite em Paris. Pra mim, é o filme do ano por enquanto.

Midnight in Paris (ESP EUA / 2011 / 100 min / Woody Allen)

INDICAÇÃO: Quem gostou de Desconstruindo Harry, Tiros na Broadway, A Rosa Púrpura do Cairo, etc.

NOTA: 9.0

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Herói envergonhado


A maneira em que os heróis têm sido retratados no cinema revela um dos conflitos mais presentes na cultura popular hoje em dia: a necessidade de projetar algum tipo de virtude, de capacidade, de figura admirável, brigando com o fato de que a cultura se tornou anti-ambição, anti-autoestima - ou seja, os valores que tornam os heróis possíveis. Os anos 80 e 90 foram décadas em que a cultura foi dominada por projeções inspiradoras e romantizadas do ser humano, tanto no cinema quanto na TV e na música. A partir dos anos 2000 as coisas foram mudando. Os heróis não foram abandonados por completo, pois isso seria impossível: é da natureza humana querer ter algo pra aplaudir, admirar e servir de inspiração - mas agora isso briga com o medo de ser acusado de ser arrogante, superior, ou pior: de ferir os que se sentem fracos. Então os heróis dos filmes, da TV e da música estão sendo diminuídos - eles demonstram certas virtudes, mas de uma maneira corrompida, disfarçada, envergonhada, misturada com algum elemento subversivo, que serve como um perdão por suas qualidades.

Existem vários tipos de "heróis envergonhados", mas eles revelam sempre a culpa da parte dos artistas em projetar autoestima, habilidade, nobreza; um senso de orgulho e ambição que muita gente considera nocivo hoje em dia.

Isso tudo é muito evidente nos filmes de super-heróis, por exemplo, que começaram a ficar cada vez mais sombrios e realistas. Os heróis, em vez de serem figuras de destaque, personagens carismáticos, maiores que a vida, passaram a ficar mais "humanos", comuns, apresentando todo tipo de fragilidade e de distúrbio psicológico.

As animações infantis também revelam claramente essa mudança. Em vez das princesas belas e inocentes
dos tempos da Branca de Neve ou mesmo da Pequena Sereia, você tem figuras muito mais simplórias: príncipes e princesas sem glamour, cínicos, às vezes de caráter ambíguo, que falam e gesticulam de maneira comum, fazem caretas, estão frequentemente em situações e poses ridículas, não têm a nobreza que caracterizava os personagens Disney de antigamente.

Há também uma série de programas de TV e artistas pop que levantam a bandeira dos "losers", como Glee, afirmando que agora é a vez dos fracos conquistarem os holofotes.

Não estou dizendo que um herói não possa apresentar fragilidades ou desvantagens. Muito pelo contrário - acho importante que um herói tenha vulnerabilidades e pontos fracos, pois seria impossível para o público se identificar com um ser perfeito e indestrutível. Alguém infalível que realiza um grande feito não diz nada para o espectador. Só pode ser uma inspiração alguém que tenha limitações humanas naturais e mesmo assim supere essas limitações e conquiste seus objetivos. Mas há uma diferença grande entre ter limitações, fragilidades, e ser um "herói envergonhado". A principal é que, no primeiro caso, o foco está na projeção das virtudes e não na projeção das falhas - as qualidades e as conquistas do herói são dramáticas, convincentes, empolgantes, memoráveis, criativas, as fragilidades estão presentes apenas pra dar um senso de realismo e tornar a superação ainda mais intensa. Já num filme de "herói envergonhado", toda atenção é dada às fragilidades, às inseguranças, ao lado "humano" e "realista" do herói, mas nunca vemos uma apresentação dramática de suas virtudes, daquilo que faz dele digno de ser admirado (é comum essas figuras fazerem parte de um grupo, onde a atenção é diluída entre vários personagens, o foco seja o trabalho em equipe, e o protagonista não ganhe crédito demais por suas conquistas).

É importante também diferenciar entre desvantagens, fragilidades, e falhas de caráter. Enquanto desvantagens e fragilidades são aceitáveis e criam uma ponte pro espectador se identificar com o herói, falhas de caráter são no fundo uma tentativa de corromper o conceito de herói.

Outra maneira de diminuir o herói é através do uso de humor. Não que o herói não possa ser divertido ou 
ter senso de humor. A pergunta a ser feita aqui é: você está rindo com o personagem ou do personagem? Não há problemas em rir de coisas que o personagem faz intencionalmente e que não diminuem sua estatura. Mas rir às custas do herói é quase sempre errado, a não ser que você esteja vendo uma paródia.

Heróis são feitos pra provocar inspiração - as crianças saem do cinema motivadas, imitando seus gestos, querendo ser como eles. Já um "herói envergonhado" é feito pra amenizar a baixa autoestima, dar um senso de conforto pro espectador, de "inclusão", dizendo que ninguém é grande demais - que todo mundo é inseguro, tem falhas, portanto não há por que se sentir inferior. O problema é que eles fazem isso de uma maneira destrutiva, mal intencionada: se você quer celebrar humildade, igualdade, o lado simples e não-heroico do ser humano, há várias formas de fazer isso sem precisar ser hostil em relação a virtudes positivas. Mas o que esses cineastas querem é contar histórias grandiosas, de superação, de integridade, de reis e princesas - ou seja, primeiro criar heróis, pra daí mostrar que eles não são tão heroicos assim. A intenção não é inspirar o fraco e dizer que ele é capaz de se superar - mas destruir o forte e trazer todo mundo pro nível do comum.

Esse elemento pode surgir de várias maneiras e em vários graus diferentes, nem sempre comprometendo o total do trabalho. Às vezes de maneira óbvia, explícita, às vezes de maneira menos evidente. Em casos onde há uma mistura de heroísmo com elementos de "herói envergonhado", meu critério final é: no fim das contas a figura é admirável? Inspira um senso de desafio, de ambição? Tem habilidades que encantam? Uma criança ficaria inspirada - gostaria de evoluir pra ser um dia como ela? Se a resposta for sim, pode ser possível perdoar o resto.

Kung Fu Panda 2

Os filmes cometem geralmente os mesmos erros (e também os mesmos acertos), e eu acho chato ter que gastar várias linhas pra explicar um conceito que já foi repetido diversas vezes aqui. Então estou pensando em criar novos termos, sempre que necessário, pra resumir ideias longas em poucas palavras (ou até em códigos numéricos - no futuro, minha resenha de Kung Fu Panda 3 poderá ser algo do tipo "98 143 17 95 01 04"!).

O problema básico de Kung Fu Panda 2 (e do 1 também) - que eu gostaria de transformar em um termo - é o do "herói envergonhado". O Panda é um herói envergonhado do tipo "fracassado". Ou seja, ele quer ao mesmo tempo mérito por lutar muito bem e nossa simpatia por ele lutar muito mal. Às vezes ele arrasa - luta com diversos vilões simultaneamente, dá saltos sobrenaturais, resiste a golpes mortais, etc, e no instante seguinte, quer que a gente dê risada do fato dele estar tão gordo que é incapaz de subir uma escadaria.


Além desse problema, que já contamina o filme todo desde a raíz, a história é ainda menos interessante que a do primeiro, e gira toda em torno da questão do Panda descobrir que é filho adotivo - algo que não envolve pois a relação entre ele e o pai é completamente superficial e mal explorada.
Pelo menos o filme não foi tão bem de bilheteria e nem se pagou nos EUA até agora. Sinal de que o público anda mais exigente?

Kung Fu Panda 2 (EUA / 2011 / 90 min / Jennifer Yuh)

INDICAÇÃO: Quem gostou de Happy Feet, Carros, Madagascar, etc.

NOTA: 4.0

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Caminho da Liberdade


Vi Caminho da Liberdade há umas 3 semanas e mesmo tendo gostado do filme não me ocorreu nada de interessante pra falar a respeito dele, então simplesmente não escrevi (não faço nada por obrigação!). Mas agora fiquei com pena e resolvi postar uma nota porque o filme é de ótima qualidade e quando sair em vídeo poderá ser uma boa indicação.

Ele conta a história de 7 prisioneiros do regime de Stalin que escapam do Gulag Soviético em 1940 durante uma nevasca. Mas fugir da prisão era o menor dos problemas - pra sobreviver eles teriam que caminhar milhares de quilómetros, enfrentando a natureza nos territórios mais hostis do planeta. O filme é uma recomendação segura - uma boa história, com vários níveis de interesse, direção competente de Peter Weir (de Sociedade dos Poetas Mortos e O Show de Truman), bons atores, visualmente impressionante, e mostra que é possível contar uma história de extrema agonia (ênfase no extrema!) sem ter que tornar isso uma experiência desagradável pro espectador.

The Way Back (EUA / 2010 / 133 min / Peter Weir)

INDICAÇÃO: Quem gostou de O Sobrevivente, No Limite, Vivos, O Império do Sol, etc.

NOTA: 7.0

domingo, 12 de junho de 2011

Namorados Para Sempre


É quase uma pegadinha de mau gosto lançar esse filme no fim de semana do dia dos namorados - ainda mais com esse título que certamente vai atrair alguns casais desavisados, que na hora que virem a cena da seringa espetando a vagina da protagonista irão perceber que escolheram o filme errado.

O filme foi indicado ao Oscar de melhor atriz pra Michelle Williams (Ryan Gosling merecia tanto quanto ela uma indicação) e mostra a deterioração de um relacionamento entre dois jovens, ao mesmo tempo em que revela através de flashbacks como foi que tudo começou, fazendo uma comparação contrastada entre o início e o fim.

Isso pode dar a impressão de que o filme é pessimista e não acredita nos relacionamentos - mas eu achei o contrário: o filme não diz que o amor é impossível e que todos os relacionamentos estão fadados ao fracasso. Não, ele diz que ESSE relacionamento específico, entre essas duas pessoas, estava fadado ao fracasso. E estava mesmo! Vendo como tudo começou, fica claro que a atração entre os dois era muito vaga, superficial. Ele se apaixona por ela à primeira vista, baseado na aparência e em trejeitos no máximo - e ela em nenhum momento pareceu estar encantada por ele. Deve ter achado ele "fofo", "bonitinho" no começo, e foi deixando o tempo passar até que confundiu isso com romance e acabou grávida.

Ou seja, o filme não é pessimista e sim realista (e pra mim isso já é quase otimismo). Se o filme tivesse mostrado um início ideal de relacionamento, entre duas pessoas realmente apaixonadas e compatíveis, e mostrasse o mesmo destino fracassado, isso seria pessimismo.

SPOILER!!!

Se os dois não se separassem no final, e o filme mostrasse eles sentados na varanda, fazendo as pazes, aceitando aquela situação medíocre com um sorriso amargo no rosto e um violãozinho tocando ao fundo, isso também seria pessimismo, pois o filme estaria dizendo "a realidade é essa, não espere mais da vida".

Do jeito que está, é um filme positivo e sensível que apenas mostra uma história de amor que não deu certo - não pra te deprimir, te deixar pra baixo, mas talvez pra servir de exemplo, dizendo "olha, se o seu relacionamento estiver DESSE jeito, caia fora imediatamente".

Blue Valentine (EUA / 2011 / 112 min / Derek Cianfrance)

INDICAÇÃO: Quem gostou de Reencontrando a Felicidade, Foi Apenas um Sonho, etc.

NOTA: 7.5

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Transcendendo Lynch


Não perca seu tempo com esse filme que não passa de um making-of amador - um extra de DVD glamourizado, tentando se passar por documentário. O filme (feito por um brasileiro, certamente fã) registra a passagem de David Lynch (diretor de Veludo Azul e Cidade dos Sonhos) pelo Brasil, quando veio divulgar o seu livro sobre meditação transcendental Em Águas Profundas. Tudo o que Lynch diz no documentário você encontra resumidamente no YouTube em qualquer entrevista que ele tenha dado nos últimos anos (Lynch é muito repetitivo nos comentários, então não há nada de novo, nada de exclusivo, nada de valioso no documentário a respeito dele que justifique sua existência). O filme tem só 84 minutos e mais da metade do material é inútil - registros desnecessários de Lynch em elevadores, Lynch em carros, Lynch dando autógrafos, como se ele fosse uma espécie de deus e qualquer registro dele em vídeo fosse tão valioso que não pudesse ser desperdiçado. Pra piorar, o diretor fica inserindo cenas pretensiosas no meio do documentário, tentando imitar o estilo único de Lynch, como quem diz "Olha David, eu também sei, me dá um emprego?".

(BRA / 2011 / 84 min / Marcos Andrade)

INDICAÇÃO: Não veja. Se você se interessou, veja essa breve entrevista no YouTube.

NOTA: 4.0

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Quebrando o Tabu


Documentário conduzido por Fernando Henrique Cardoso (e dirigido pelo irmão do Luciano Huck) que discute a descriminalização das drogas. O filme é a favor da descriminalização, obviamente, e aponta alguns bons argumentos, mostrando por exemplo que é impossível impedir o consumo de drogas mesmo dentro de uma prisão de segurança máxima. O filme mostra depoimentos de celebridades como Paulo Coelho, Dráuzio Varella, Gael Garcia Bernal e Bill Clinton, mas ainda assim parece que falta alguma coisa. Ele deixa de fora questões importantes, não desenvolve bem os argumentos, não apresenta dados científicos sobre o efeito das drogas no cérebro e no corpo, e também não entrevista ninguém que seja CONTRA a descriminalização, só pra ouvir o lado de lá e poder analisar a questão de forma mais objetiva.

Minha opinião? Sou contra o uso de drogas e de qualquer coisa que comprometa o meu raciocínio ou que me dê algum tipo de felicidade não merecida, desconectada da realidade (não vejo problemas em beber moderadamente) - mas não acho que o governo tenha o direito de dizer o que você pode ou não pode fazer com a sua vida desde que você não force os outros. Se eu quiser cheirar cocaína, me matar, dirigir sem cinto, tudo isso é problema meu. Se eu me drogar e resolver matar o vizinho, daí entra a polícia. Se o governo acha que é função dele cuidar da vida das pessoas, então quem é que estabelece o limite? Não deveria ser proibido então morar em São Paulo, pois a poluição pode te matar a longo prazo? E comer fast-food? Quem sair na rua sem filtro solar não deveria levar multa? O que é mais prejudicial? O filme não vai tão fundo.

(BRA / 2011 / 80 min / Fernando Grostein Andrade)

NOTA: 6.0

segunda-feira, 6 de junho de 2011

X-Men: Primeira Classe


Do mesmo diretor de Kick-Ass, este é um X-Men "como tudo começou" (já fizeram um filme assim sobre o Wolverine, que neste só faz uma aparição rápida).

A ideia de um "grupo de heróis" pra mim soa contraditória, pois um herói deveria ser alguém muito raro, especial. Num filme onde todos são especiais, ninguém é especial, e o filme não percebe isso; ele ainda acha que a plateia ficará admirada ao ver um X-Men erguendo um submarino, como se aquilo fosse fora do comum no contexto do filme. Mas pra mim o problema maior é que o filme acha que ser herói significa ter certas habilidades físicas. Sim, super-heróis costumam ter habilidades físicas, mas se isso não estiver associado a uma personalidade admirável, um estilo de vida fascinante, não serve pra nada (já o contrário não é verdade; existem muitos heróis no cinema que não têm super-poderes mas mesmo assim são fascinantes). Este X-Men mostra um grupo de pessoas normais, particularmente inseguras, que apenas herdaram habilidades físicas fora do comum (que são sentidas mais como deformidades do que talentos), e usam essas deformidades não pra atingir suas metas, seus desejos, o que seria mais interessante, mas para servir a nação, o grupo, etc.

No fundo é uma mensagem de auto-ajuda: "Todos temos defeitos", "Devemos nos aceitar do jeito que somos", "Somos todos especiais de alguma forma". Achei que a Katy Perry fosse entrar no final cantando "Baby, you're a firework"...

De qualquer forma, é um filme bem produzido, dentro da média, não-constrangedor e com alguns bons atores (é o terceiro filme que vejo esse ano com a Jennifer Lawrence - a Mística - indicada ao Oscar esse ano por Inverno da Alma, e gostei muito dela nos 3).

X-Men: First Class (EUA / 2011 / 132 min / Matthew Vaughn)

INDICAÇÃO: Quem gosta de Homem de Ferro, da série Heroes, Glee...

NOTA: 6.0

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Um Novo Despertar


Dirigido por Jodie Foster, o filme conta a história de um empresário em depressão (Mel Gibson) que sofre um colapso emocional completo e a partir daí começa a falar com a mão, através de um boneco de castor (!) que ele encontra no lixo, pra "criar uma distância psicológica entre ele e os aspectos negativos de sua personalidade". O trailer faz parecer que o filme é uma comedinha cult, mas na verdade é um dos dramas mais originais e interessantes que eu vi esse ano.

Por que você é do jeito que é? O que significa "ser você mesmo"? Agir sem pensar, da maneira como sempre agiu? Mas será que esse é o certo? Será que não temos que reavaliar as coisas de tempos em tempos, como ocorre na adolescência? O que te levou a ser uma pessoa mais quieta, ou mais extrovertida? O que te levou a usar o cabelo de certa forma? A escolher determinado trabalho? A rir de certa maneira? Quem está interpretando mais: o Walter com o castor, ou o Walter empresário, pai de família? É esse tipo de coisa que o filme te faz questionar (há um discurso de Gibson na TV que resume tudo de maneira genial) e se você conseguir abstrair do absurdo da premissa, o filme é muito rico psicologicamente. Comercialmente foi um fracasso absoluto (não faturou nem 1 milhão nos EUA, tendo custado mais de 20), talvez até pela péssima imagem pessoal de Mel Gibson.

"Beaver" (castor) em inglês também serve como apelido pra parte íntima da mulher, então achei suspeito quando soube que o novo filme da Jodie Foster (assumidamente lésbica) se chamaria The Beaver, pois seria o mesmo que a Ana Carolina lançasse um álbum chamado A Perereca. Mas no fim o filme não tem nada a ver com isso.

The Beaver (EUA / 2011 / 91 min / Jodie Foster)

INDICAÇÃO: Quem gostou de O Solteirão, A Garota Ideal, Uma Mente Brilhante, etc.

NOTA: 7.5