segunda-feira, 12 de março de 2018

Pequena Grande Vida


(Esta crítica está no formato de anotações - em vez de uma crítica convencional, os comentários a seguir foram baseados nas notas que fiz durante a sessão - um método que adotei para passar minhas impressões de forma mais objetiva.)

ANOTAÇÕES:

- Todo o conceito das pessoas encolherem por questões econômicas é uma ótima premissa (claro que não faz muito sentido e seria desastroso a longo prazo, mas pra um filme despretensioso de fantasia é uma boa sacada).

- A introdução do filme é divertida; o anúncio da descoberta, a apresentação dos primeiros "pequenos", a noção de como seria a vida do casal em Leisureland, a mansão em que eles viveriam, etc.

- O problema é que o filme não tem um clima tão divertido quanto a sinopse pede. É como se ele quisesse ser uma ficção-científica escapista do tipo Jurassic ParkQuerida, Encolhi as Crianças (ou talvez uma comédia high-concept como O Primeiro Mentiroso) mas fosse dirigido por uma pessoa que só soubesse fazer filmes Naturalistas, não-comerciais, sobre personagens comuns e problemas da vida real (o que faz sentido quando você lembra que o filme é do Alexander Payne, diretor de Sideways - Entre Umas e Outras, As Confissões de SchmidtOs Descendentes).

- O começo é um pouco arrastado e sem empolgação. O casal tem uma relação chata, demora meia hora até eles irem fazer o encolhimento, e até agora não sabemos que rumo a história irá tomar, o que eles farão da vida após o encolhimento.

- Os preparativos pro encolhimento são horríveis (eles arrancando as obturações dos dentes, etc). Há algo de cru na fotografia que simplesmente não combina com o tom escapista da trama (o contraste bizarro entre a trilha sonora alegre que lembra de desenho animado, com as imagens hospitalares realistas).

- A cena em que o Matt Damon acorda depois do encolhimento e vai checar o pênis pra ver se está tudo bem é um toque que funcionaria num filme do Adam Sandler, mas aqui soa totalmente artificial, pois não combina com o personagem nem com o clima que o diretor criou pra história (o diretor parece não saber que tipo de filme está fazendo).

- Divertido a Kristen Wiig desistir do encolhimento e largar o Matt Damon lá sozinho. Agora pelo menos surgiu um conflito central que pode dar um rumo pra história. Ela vai mudar de ideia? Ele tentará reverter o processo pra voltar ao tamanho normal? Eles tentarão manter um relacionamento com tamanhos diferentes (isso seria interessante de ver!).

- O filme não explora bem Leisureland. Quando o Matt Damon encolhe, ele já está totalmente deprimido por estar sem a namorada, e acaba nem aproveitando o lugar. Não vemos ele vivendo a "vida ideal" primeiro, curtindo seus novos luxos, pra daí algo dar errado. Já começa tudo uma enorme frustração. O diretor parece mais interessado em desenvolver o conceito do encolhimento, os impactos disso na sociedade, mostrar como ele refletiu sobre a ideia, do que em aproveitar a situação pra proporcionar uma aventura interessante pro público. O filme é sem vida, sem emoção.

- O roteiro abandona totalmente a Kristen Wiig... Em vez dessa reviravolta criar um objetivo pro Matt Damon, ele parece simplesmente aceitar que perdeu a namorada, e agora o filme fica mostrando o dia a dia dele em Leisureland numa série de situações chatas que não caminham a lugar algum: ele saindo em dates desinteressantes, indo em festas e conhecendo pessoas novas, experimentando drogas (qual a necessidade de mostrar aquela viagem de ácido?), talvez pra tentar provar que dinheiro não traz felicidade.

- Qual a necessidade dessa empregada vietnamita pra história? A história da prótese da perna? A amiga que tem câncer de estômago e precisa de cuidados? O filme deu uma guinada totalmente absurda agora na metade... Abandonou totalmente a história original. Não só a Kristen Wiig já não importa mais, como o fato deles terem encolhido também parece irrelevante. Se no fim o filme ia ser sobre um homem abandonando seus objetivos pessoais pra passar a se dedicar aos necessitados, isso é uma história que poderia ter ocorrido na vida normal do personagem. Nenhum aspecto do encolhimento é relevante e fundamental pra essa narrativa, então parece algo simplesmente mal escrito, uma história onde as "partes" não se integram ao "todo".

- Agora está claro o propósito do filme (e por que ele estava tão bizarro e mal feito no começo). A intenção nunca foi criar um bom entretenimento. É como A Forma da Água e tantos filmes atuais - o cineasta apenas se infiltrou num gênero comercial pra conseguir transmitir sua mensagem política pra plateia. Mostrar como o capitalismo é "malvado", como os ricos maltratam os pobres, como o altruísmo é nobre, e o egoísmo é mau (já devia ter desconfiado, afinal o Matt Damon está no filme!).

- Ridícula essa personagem da faxineira. Até parece que uma mulher tão pouco sofisticada seria uma ativista política reconhecida mundialmente.

- Agora Matt Damon vai com o vizinho e a faxineira viajar pra Noruega?! Encolhidos? Passear de barco? Não faz o menor sentido pessoas encolhidas saírem por aí na natureza selvagem, a colônia original ser um lugar totalmente desprotegido de animais, etc. É certamente um dos roteiros mais nonsense dos últimos tempos.

- Agora Damon abandonou sua namorada, sua vida luxuosa, e está iniciando um romance com uma faxineira vietnamita perneta na Escandinávia (o paraíso dos socialistas) enquanto debate os perigos do aquecimento global com intelectuais pretensiosos.

- SPOILER: Ridícula a história do fim do mundo, a "arca de Noé" que irá salvar apenas os encolhidos, que viverão na sociedade comunista ideal - uma cidade totalmente planejada, composta apenas de pessoas "pequenas", niveladas por baixo, com comida e recursos naturais pra milhares de anos sem que ninguém tenha que trabalhar de fato, etc.

- SPOILER: Se são tão poucas pessoas que irão entrar na "arca", certamente seria possível construir uma gruta do gênero pra pessoas de tamanho natural. É outro desenvolvimento péssimo da história que não depende em nada do conceito do encolhimento (sem falar que é ridículo a ciência ser tão avançada a ponto de poder encolher pessoas, mas não conseguir ainda proteger as pessoas do clima!).

- SPOILER: O final é um tédio. Matt Damon decide não salvar a própria vida, declara seu amor pela faxineira vietnamita perneta, e os dois partem juntos na missão de ajudar os necessitados e os "sem teto" de Leisureland (o roteirista deve ser débil mental pra pensar que em tão pouco tempo existiriam tantos pobres e mendigos em Leisureland, sendo que a única razão das pessoas encolherem é justamente porque elas teriam segurança financeira pra vida toda).

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CONCLUSÃO: Parte de uma premissa curiosa, mas se desenvolve numa narrativa caótica, ilógica, pouco divertida, cujo objetivo é promover ideologia política e valores deturpados.

Downsizing / EUA / 2017 / Alexander Payne

FILMES PARECIDOS: Elysium (2013) / O Preço do Amanhã (2011)

NOTA: 2.0

12 comentários:

Marcus Aurelius disse...

Olá Caio. Pelo que eu li desse filme, encolher é apenas uma metáfora para uma medida que empresas fazem para desburocratizarem. Isso é chamado de Downsizing, ou reengenharia. Então o filme é todo metafórico. Matt Damon no caso, não é uma pessoa, é uma empresa. Na verdade, todos os encolhidos representam empresas.

Eu odeio filmes (apenas) metafóricos. E o fato de o personagem principal representar "uma empresa capitalista" e agir ideologicamente como um socialista, me fez sentir repugnância do filme. Talvez por se tratar de uma metáfora tão aberta, o filme não é assumidamente uma fantasia escapista. Sinto que a intenção foi clara, e não "infiltrada".

Bem, de qualquer forma, nunca tinha ouvido falar no procedimento de Downsizing antes, então as premissas de minhas conclusões não são muito fortes.

Mas não entendi quando diz "já devia ter desconfiado, afinal o Matt Damon está no filme!". Ele é um socialista?

Caio Amaral disse...

Oi Marcus.. o termo "downsizing" é usado mesmo nesse contexto de empresas que reduzem seus custos, etc.. mas isso não quer dizer que o Matt Damon simbolize uma empresa na história.. não teria sentido interpretar o filme dessa forma..

Digo "infiltrado" pq o filme se vende como uma produção hollywoodiana de grande orçamento, cujo objetivo é entreter o público, etc.. mas daí quando você compra o ingresso e entra no cinema, vê que na verdade o cineasta é quase anti-entretenimento, e só deu essa roupagem pro filme pra "dourar a pílula" e fazer um público maior absorver a mensagem política..

Ah sim, o Matt Damon é super ativista.. veja o que ele diz nesse vídeo por exemplo:
https://www.youtube.com/watch?v=EyLafU0OEY0
E quase todo filme dele vem com alguma mensagem anti-capitalista de algum tipo.. então ele é daqueles que realmente acreditam na "causa", não é desses atores que apenas vão com a onda pra preservarem a popularidade, etc. Abs!

Anônimo disse...

Então, simplificando, seria uma história onde o protagonista acorda para sua 'pequenez' e aprende a se solidarizar com os 'pequenos' do mundo. Apenas fizeram isso com uma roupagem de ficção científica, e criaram uma metáfora mal trabalhada.

Prosseguir o romance original seria difícil, mesmo numa comédia. Nem a Dreamworks, com toda sua irreverência, ousou manter junto o casal de "Monster vs. Aliens", depois que a mulher se tornou gigante.
Pedro.

Caio Amaral disse...

Ótimo resumo Pedro! Rssss.
Ah, se conseguiram fazer um filme onde uma mulher vive um romance com um peixe.. e ganharam o Oscar.. tudo é possível acho, rss.
Abs.

Unknown disse...

Péssima crítica

Unknown disse...

Filme é imprevisível, e não segue uma fórmula de sucesso, por isso é muito bom, e sua crítica é muito mais influenciada pelo teu gosto, que pelos fatos

Caio Amaral disse...

Há muitos filmes imprevisíveis, que não seguem fórmulas de sucesso, e são completas bombas... e outros que seguem fórmulas de sucesso, e são brilhantes.

Quanto a minha crítica não ser baseada em fatos, e sim influenciada pelo meu "gosto".. Mal tenho o que comentar, pois você não apontou onde isso ocorreu (nem o que haveria de errado nisso, já que eu nunca disse que minhas críticas seriam imparciais). Minhas críticas ao filme foram bem específicas, e dei exemplos concretos do que me incomodou em cada etapa da trama... Já a sua "crítica" à minha crítica foi completamente vaga, sem exemplos... Isso sim reflete a mentalidade de alguém que julga com base em gosto, sem referência a fatos.

kessia disse...

Também achei horrível!

Lux Ran disse...

Gostei de sua análise e concordo com muita cousa. Queria fazer uma complementação. O Paul era casado e precisou fazer o divórcio, o que diminuiu muito o patrimônio dele. Em algum momento alguém elogia ele por ter cedido no acordo. Acho que ele e a esposa dividiram a pobreza e não exatamente o dinheiro. Outra coisa, quando eu vi as casas enormes pensem que teria que ter pessoas para limpar as casas. Talvez os necessitados sejam refugiados, como a vietnamita. Sistema de colonização...

Caio Amaral disse...

Faz tempo que vi o filme.. Quanto a Paul e a esposa, não sei se entendi seu ponto.. Mas esses necessitados em Leisureland não me pareciam estar na categoria da vietnamita (que era perseguida e foi encolhida contra a vontade). O filme mostra como se fosse uma consequência econômica daquele sistema, o que me pareceu bem forçado. abs!

Anônimo disse...

É sua opinião mas aqui vai a minha: sua crítica é péssima. O filme é uma excelente e certeira reflexão sobre a sociedade: não adianta encolhermos, nossos problemas e nossas mazelas, frustações, alegrias e decepções, estarão lá. No mesmo tamanho, com o mesmo sentido.

Eu mesmo não gostaria de ver tanto realismo em filmes. Se for pra ver a realidade, basta abrir os olhos e ela está lá. Vc é cinéfilo, melhor rever seus conceitos.

Caio Amaral disse...

Na crítica eu aponto diversos problemas de direção, trama, lógica, desenvolvimento de personagem.. vc parece achar que se eu não tivesse achado a visão de sociedade do filme equivocada e desprezível (o que de fato eu acho) eu teria achado o filme bom.